domingo, 20 de dezembro de 2009

Virá o dia em que Chevrolets e Buicks…

Augusto Alberto


Nos anos 20/30 e 40 do século passado, o Mondego foi a Meca do remo Nacional. A Figueira por uma semana era uma babel de línguas e costumes. Só para termos a noção da diversidade, também a Croácia inscreveu o nome na lista dos vencedores da belíssima Taça Vitória. Depois, o fascismo, sem apelo, deu a primeira pancada e empurrou o Mondego para fora, tornando a maravilhosa Avenida Saraiva de Carvalho numa via para carros, e com o ganho, construiu a aberração que é o porto comercial, naquela que deveria continuar a ser a solene frente ribeirinha. E a diversidade cultural e linguística acabou.
A família mudou-se para Aveiro no início dos anos 50, na procura de melhores dias. Uma família de figueirinhas com um profundo gosto pelos barcos e por isso, em fim de semana de campeonato Nacional de Remo, a realizar no notável recanto do Rio Novo do Príncipe, um dos rios que desagua no fabuloso delta que faz a ria de Aveiro, a família alugava uma limusina de 12 lugares e partia rumo ao rio. Num lugar encantador e limpo, houve um ano em que a barcaça que fazia a transferência do povo de uma margem para a outra, na procura da melhor sombra dos choupos, para assentar e abrir o farnel, por demasiada carga, afundou. Por sorte, o rio ali não tinha mais de metro e meio de profundidade e isso permitiu que o povo se mantivesse em pé, sem outro perigo, para lá de uma boa molha numa água absolutamente cristalina. Mas sucedeu o sacrilégio. As saias longas e rodadas das mulheres camponesas, subiram até à superfície e as pernas e cuecas ficaram à mostra. Foi um gozo, em tempo cinzento.
Mas depois foi ali construída uma fábrica de papel e o Rio Novo do Príncipe tornou-se um lugar impróprio. Nos últimos campeonatos, nos anos 80, atletas pararam e foram levados para o hospital e outros recusaram competir. Havia uma massa esbranquiçada, espessa e nauseabunda, que os barcos rompiam a custo e por isso o oxigénio à tona de água rareava.
E agora o Mundo continua sujo e incapaz de chegar às medidas necessárias para o tornar mais terno e viável.
Na biodiversidade, os que não tem voz e incapazes de se organizar, ainda que sejam os mais corpulentos, como os ursos polares, por exemplo, são afinal os mais frágeis.
Hoje, em Copenhaga, os chamados países em vias de desenvolvimento reclamam dos países ricos, porque para serem desenvolvidos, sujaram em demasia e por hora, acham que devem ser exactamente a eles a quem os maiores esforços deverão ser pedidos. Mas os países ricos, para manter o nível, não querem baixar a fasquia e acham que os países em vias de desenvolvimento deverão ser os mais esforçados. E o mundo, nesta espécie de democracia vira latas, está assim em desacordo, porque os pobres estão fartos e por uma vez, estão, e muito bem, a mostrar os dentes.
Evidentemente que o homem, sobretudo o rico, que é quem mais suja, o único a quem esta biodiversidade deu o tino, vai ter que saber que, ou atina ou então, poderá ter quilómetros de asfalto em auto-estradas, mas vai haver um dia em que vai deixar de haver gente para guiar os fabulosos chevroletes e buics, ainda que a gasolina esteja ao preço da uva mijona, e não haverá alguém, como o Presidente Lula, para dizer, “merda, como é que se faz marcha atrás”. Não será possível, porque tiraram a mudança.

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