Augusto Alberto
O fim do dia dou-o à leitura e, por isso, raro me dou à televisão. Mas ontem, talvez embalado pelo calor da lareira, deu-me a modorra e acabei por ver quase até ao fim um espectáculo, escorreitinho, transmitido pela televisão pública, em ordem a aplaudir os melhores nas artes no ido ano de 2011. Com o nome genérico de “Portugal aplaude 2011”, foi apresentado por uma carinha e corpinho larocas e correu no teatro Nacional D. Maria II. Por lá passaram nomes consagrados, como António Chainho, Olga Roriz, pesadita para grandes voos, Luís de Matos, e outros, a par de gente nova, que confesso não saber que existia.
Na plateia, o topo mundano da capital, chegado entretanto nas caleches e coches, reluzentes e de alta cilindrada, como convêm a gente de pergaminhos. No topo do convívio, o Secretário de Estado da Cultura, o Presidente do Conselho, acompanhado de sua esposa, que deixou cair uma lágrima no momento em que Sara Tavares cantava. Saudades das origens, e muito bem. E acima de todos, um dos gestores de topo, que são quem manda em Portugal. O chefe da PT. Acredito que os mendigos que habitam todas as noites as arcadas do teatro Nacional tenham recebido indicações para voltarem, nunca antes da meia-noite, para não incomodar o sossego de tão fina gente. Mal seria que uma certa miséria e um certo cheiro a corpos mal lavados evoluissem naquele recanto da noite lisboeta, e logo àquela hora. Em todo o caso, eu que tenho um coração de manteiga, até entendo as preocupações em não estragar a noite a tão distintas figurinhas.
Mas, digo eu, como seria bom que em vez de ser a nata da capital a ocupar as cadeiras do D. Maria, fossem as centenas de famintos, mal lavados e de barba medonha, que embrulhados em cartão e cobertores, coçados e rançosos, fazem das sacadas do Teatro Nacional o quarto para o sossego das noites e dos que não tendo já ali lugar, se espojam por Santa Apolónia ou na Gare do Oriente.
Mas, digo eu, como seria bom que em vez de ser a nata da capital a ocupar as cadeiras do D. Maria, fossem as centenas de famintos, mal lavados e de barba medonha, que embrulhados em cartão e cobertores, coçados e rançosos, fazem das sacadas do Teatro Nacional o quarto para o sossego das noites e dos que não tendo já ali lugar, se espojam por Santa Apolónia ou na Gare do Oriente.
Que não haja a mínima dúvida. As cadeiras do Teatro Nacional, não chegariam. Desse modo, todos os que se ligassem à TV Pública, nesse instante, perceberiam como está faminto e decadente este Portugal.
1 comentário:
Aliás o programa tresandou a propaganda (da cara) tantas foram as vezes que filmaram o PM. E outros políticos, para além do SEC, nada!
Foi o PM, o seu patrocinador (EDP) e Portugal a seus pés. Estes gajos são doidos.
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