domingo, 17 de fevereiro de 2008

Jornais de referência (croniqueta de fim de semana)

O caso passa-se no Kosovo, há já uns anitos. O enviado especial de um grande jornal português, vê, observa, fala, pergunta, investiga, isto é, trabalha. Envia as reportagens para a redacção. Recebe um telefonema do editor, que o texto está um bocado contra a Nato, que não pode ser assim, coisa e tal e tal e coisa. Ele responde que escreveu o que conseguiu obter. “Ah, mas temos que alterar algumas coisas”. Ele terá dito para alterarem o que quiserem, mas que tirassem o seu nome da reportagem.
Outro caso, este com dois dias. Num outro grande jornal português, em manchete, consegue-se dizer duas calinadas em 6 palavras: “Congresso de um sindicato em crise”. Toda a gente sabe que a central sindical não é um sindicato. Não tenho a veleidade de pensar que quem escreveu isso não sabia, seria um atentado à inteligência de quem fez a manchete. Logo, ou foi por má fé ou para agradar ao patrão (o que vai dar ao mesmo), porque isto de comunicação social está toda em boas mãos, e a informação é muito bem manipulada. Também pode ter sido por ignorância, embora eu acredite menos nesta hipótese.

Num país onde o analfabetismo ainda é monstruoso a comunicação social deveria ter responsabilidades acrescidas. Acontece o contrário. Outra coisa arrepiante: nos cursos de comunicação social, de jornalismo, são estes jornais apresentados como exemplos, imagino eu, que não tenho curso algum de jornalismo. Quer dizer, aprende-se logo à nascença a mentir.
Foi José Martins, director do saudoso semanário figueirense “Barca Nova”, quem me iniciou nesta coisa de jornais. No meio dos seus ensinamentos, depois de dar vários exemplos de coisas parecidas com os casos que citei, disse uma frase que me ficou na memória e que sempre me guiou na minha actividade jornalística: “Não há nada mais horrível que um jornalista mentir”.
Não faço a mínima ideia se o jornal em questão vai pedir desculpas à CGTP-IN, mas recordo um caso passado há já uns anos com um jornal francês. O “Le Monde” noticiou a morte por suicidio de Mónica Vitti. A actriz, ela própria, negou e disse que estava vivinha da silva. Então o jornal enviou-lhe cem rosas vermelhas com a explicação da cor. Dizia o bilhete: “Cem rosas vermelhas de vergonha”.
No primeiro caso, ainda que com anos de atraso, a minha solidariedade, respeito e admiração para o jornalista.
No segundo, não acredito que a CGTP-IN receba algum pedido de desculpas. Porque já não há vergonha. Infelizmente.

1 comentário:

samuel disse...

Pedido de desculpas?!
Ficaria realmente admirado! O melhor, no entanto é "esperar sentado"...