Augusto Alberto
Ao olhar para a bancada do governo e ver o nosso primeiro-ministro,
mais o ministro Mota Soares, na sessão parlamentar em que se tratou da economia
social, ocorreu-me pensar no Conde de Abranhos. Fulano muito dado à mitigação
da podridão, há muitos, mesmo muitos anos. Tive a ousadia de comentar este
pensamento, com um companheiro que logo chistou: “continuas verrinoso”.
Talvez, sim senhor, um pouco verrinoso e
também com estas teclas um pouco chocarreiras e por isso, dá-me sempre vontade
de voltar à carga, agora, sublinhando o melhor do pensamento do Conde de
Abranhos, em forma de torpe projecto, com vista a disciplinar e regulamentar a
caridade, por amor dos desprotegidos. O
Estado forneceria grandes casarões, com celas providas de uma enxerga, onde
seriam acolhidos os miseráveis. Para conseguirem a admissão, deveriam provar
ser de maior idade, haverem cumprido os seus deveres religiosos, evitar ter
ideias subversivas pela greve ou pelo deboche. Deveriam ainda provar…nunca
terem vivido amancebados nem possuírem o hábito de praguejar e blasfemar.
Desse modo, bem aferrolhados, com uma
razoável enxerga e um caldo diário, podem dormir descansados, sem receio de
perturbações da ordem ou de revoltas do pauperismo.
Com esta manha e magros gastos, parecia ao Conde que acabava
a mitigar a porcaria, que ele e os seus pares desenvolviam, sublinhando ainda a
prática fétida, na forma do seu governo, dizendo... dou aparentemente a soberania ao povo, que é forte e simples. Mas
como a falta de educação o mantém na imbecilidade, e como o adormecimento da
consciência o amolece na indiferença, faço-o exercer essa soberania em meu
proveito…E quanto ao seu proveito, adeus, ó compadre! Eu sou a lei! Idiota! Não
vê que por trás dele, sou eu, astuto manejador de títeres, quem move os cordéis...
Acredito que comece agora o meu companheiro a perceber onde
quero chegar. Suspeito eu, que lá para o largo do Caldas, na sede à Lapa e em
Belém, tenham estudado com prosápia e discutido na forma de catarse caritativa,
o modo de colocar, neste ensejo, com algum revivalismo, alguma da proposta
legislativa de meados do século XIX, do Conde de Abranhos, após o reviralho da
Maria da Fonte. Mantenho, pois, que continua no país a torrente de cinzentismo
e podridão, e que em paralelo, medram em surdina renovados Abranhos,
espertalhaços e ligeiros, como medram os abrunhos, numa terra onde ainda há
muitos abrolhos.
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