domingo, 16 de novembro de 2008

"Histórias de mineiros" (II)

Augusto Alberto


Chamavam-lhes Malteses. Vinham do norte, das bandas do Porto e Braga, que os meios para viver por lá eram escassos. Mas também havia os serranos. Esses eram os melhores nas galerias húmidas e negras do carvão. Entravam por um poço na parte de cima da mina, em plena serra.
Os do Norte viviam num barracão colectivo. Ali dormiam, em cima de uma tarimba ou de colchão enchido com folhas de árvores colhidas na floresta. Ali comiam o que cada um sabia e podia pobremente confeccionar; que o mineiro nunca soube o que foram mimos, disse-o o mineiro: nasceu pobre, menino de pé descalço e roto. Em adolescente e adulto, trabalho duro. Sempre.
O tempo era passado a jogar as cartas ou conversando, que divertimentos não os havia.
A família, essa estava lá longe, na terra, e raramente era visitada. Ver a família era por altura de festas grandes, pela Páscoa e Natal e pouco mais. É que a viagem era longa e dinheiro não o havia.
Era uma separação cruel. Eram longos meses de separação forçada. Separação que só mais tarde teve o seu fim com a construção do Bairro de Santa Bárbara. Um bairro de casinhas pobres,
típico do fascismo, em seu entender, como convinha para mineiros.
Quem o fez talvez tivesse pensado que sempre era um pouquinho melhor do que as casas lá das suas terras ou de que viver em camaratas colectivas. É bem possível, mas só que o mineiro não necessitava de esmolas, mas que o reconhecessem como homem, que pelo seu duro trabalho mais cuidados haveria de merecer.
Logo pela manhã o mineiro ia da superfície ao fundo da mina. Ia 750 metros ao poço mais fundo.
Chamavam-lhe o “poço juda”.
Primeiro descia o encarregado com uma lanterna especial, para ver se havia na galeria “gás”. É que se houvesse “gás” o mineiro não trabalhava, porque havia perigo de explosão. Mas, às vezes, apesar deste cuidado preliminar, o mineiro era apanhado pelo “mazuque” ou pelo “grizú” e então era a explosão inevitável. E da explosão quase sempre resultava a morte na mina.
É difícil imaginar a descida dos mineiros ao poço fundo, para o comum dos homens que giram à superfície.
O mineiro, esse tinha que descer em busca do carvão.
Numa primeira fase, enquanto a técnica não chegou, eram mulas que com a sua força muscular faziam andar a vagonas com o carvão e com os homens, nas profundezas da mina.
Para os animais era também um esforço bruto. Esforço tamanho que também eles, os animais, rebentavam.
Muitas vezes, perto da exaustão, diz o mineiro: - “levavam um tiro que lhes acabava com o martírio”.
Lá em baixo, na galeria estreita, homem e vagona, num bailado comum, iam alargando a exploração.
- Às vezes o homem era apanhado pela vagona. E alguns morreram – continuou o mineiro. Outros ficaram inutilizados para o resto da vida. Mas apesar de vermos essas cenas tínhamos de descer. No outro dia lá estávamos. Era a vida. Vida muito dura, que era assim que um homem tinha de a ganhar.

3 comentários:

Anónimo disse...

Alex
É por todos estes sacrifícios, que os mineiros são todos milionários, e donos das minas etão na miséria...Não é verdade companheiro?
É preciso lutar pela justiça, e nós não vamos deixar de o fazer.
Abraço

Anónimo disse...

Muito maltratada sempre foi esta classe. Uma das profissões mais duras (senão a mais dura), que quase sempre deixa maleitas eternas nos mineiros e sempre tão pouco reconhecida, tão pouco incentivada, tão miseravelmente tratada. Ainda a calhar, a "historieta" das minas de Aljustrel, agora muito badalada, como sempre pelas piores razões.
Ainda a propósito, não podia deixar de referir o "Germinal" de Zola, um dos livros mais marcantes que li até hoje.

Saudações do Marreta.

Anónimo disse...

Caro Alex, ainda em relação ao comentário que deixou no "Cheira-me a Revolução" relativamente à questão colocada sobre as origens do Partido Comunista Português em movimentos anarco-sindicalistas, e cuja resposta foi apagada pela censura do auto-proclamado secretariado-geral do blog, respondo-lhe que evidentemente que sabia, mas que em função das seguintes transcrições retiradas de comentários do post em questão, deveria ser antes posta ao colaborador CRN.

- "Só não vê quem não quer, conversa, demagogia, protagonismo, isso sim, isso querem eles, os covardes, déspotas, fascistas, mentirosos, enfim, os esbirros inconscientes da corja.
Correcto é afirmar-te dentro do partido com o qual cada um se identifique, sendo o PCP aquele que entendo como único lógico, os anarcas não poderão nunca ter um partido, ou seja, unirem vontades, uns perdidos." - CRN

- "O comunismo não é um ideal da cidadanía, o trabalhador é o comunismo, o cidadão comporta burguesia, alta, média, baixa, e todos os estratos da população, governantes, ladrões, assassinos, corruptos, e, como estarás de acordo, não é o comunismo, pode ser a anarquia." - CRN

(Fora outras que comparavam os anarquistas a bolotas podres, feitas no "Revolucionários").

Quanto à pergunta específica de eu ser anarquista, respondo-lhe que ideologicamente estarei efectivamente de acordo com muitos dos pressupostos do anarquismo, mas também, e visto que é impossível dissociar, pese embora os antagonismos existentes, comunismo e anarquismo, dir-lhe-ei que fui votante da CDU, porque acredito que neste sistema político vigente será a força em melhores condições de defender os meus interesses e lógicamente da minha classe.

Foi sensivelmente isto que escrevi na minha resposta ao seu comentário e que foi censurado.

Saudações do Marreta.