Nasci na Figueira, em zona de artificies, o Vale, mas cedo a família mudou para Aveiro, mais concretamente para as Gafanhas. Fixamo-nos na Praia da Barra, o meu lugar fetiche. Por lá cresci, passei de menino a jovem e depois a adolescente. Fiz paragens, mas sempre regressei, até me fixar em definitivo nesta minha terra natal. Por lá ainda tenho família muito chegada, deixei a minha mãe enterrada e há muito pouco tempo uma jovem sobrinha. A saudade está-me sempre a chamar, mas não creio que possa voltar, a não ser por escassos momentos. Habituei-me a adormecer com o som da vozeira ronca que em dia ou noite de nevoeiro, lá do alto dos mais de 60 metros do esguio farol, sinalizava os barcos que passavam, indicando que ali está uma barra e terra. Em 1964, se me não engano, da janela mais alta da casa onde vivi, vi em aflição, em tarde de muito vento e mar cão de Setembro, virar a traineira Praia da Atalaia e levar para si dezenas de vidas. Foi um horror.
Pelo molhe interior, a chamada meia-laranja corriam e correm, numa espécie de romaria, famílias inteiras na hora da chegada ou da partida dos barcos da frota do bacalhau. Recordo-me de gente estrangeira, franceses e alemães, de gravador na mão, a registar sons de alegria quando da chegada, ou de dor na partida. O som do barco na despedida, parecia um punhal que retalhava e entrava pela carne. Muitos dos meus amigos de escola, tinham pais nesses mares longínquos e partilhavam com eles poucos dias por ano. Ficaram barcos célebres, o Santa Mafalda, o Santa Joana Princesa, o Capitão Ferreira, o Rainha Santa Isabel e outros, alguns utilizando ainda a técnica da pesca à linha.
Há anos atrás, movido pela saudade, comprei uma revista de grande qualidade gráfica e documental, editada por alturas da exposição de 1998, a “oceanos”, que trata exactamente dessa epopeia do bacalhau. Não me foi barata, mas valeu a pena, porque me respondeu às saudades e a muitas inquietações. Dessa revista desejo, nesta hora de novas inquietações, sublinhar aqui justas preocupações.
… Em finais do século XVIII, os colaboradores das memórias Económicas da Academia, lastimavam a decadência das pescarias do reino de Portugal. Apontavam como factores dessa decadência a extrema ignorância e pobreza dos pescadores…as vexações dos oficiais de justiça quando da arrecadação dos tributos...
…mas então como explicar que Viana do Castelo ainda contasse com uma flotilha de 80 embarcações, em 1750? E porque razão em 1816, já não tivesse uma única?... é que tomadas do delírio das grandezas, todas elas (as embarcações) se tinham metido de carreira para o Brasil, que foi sempre terra encantada.
…Alberto Souto, deputado por Aveiro, em 1097, disse… – bom seria que se protegesse essa importantíssima indústria através da aplicação “na protecção aos pescadores, marinheiros e empresas nacionais uma pequena parte desse imposto”, evitando-se, assim, “ a emigração das terras da beira-mar…”
Dá a ideia de que nada nesta pátria muda e duvido que alguma vez este povo tenha sido feliz. Estamos há séculos entregues a elites de fancaria, inapta, de um só sentido, que salivam apesar de pança cheia, mesmo com o povo de rastos. Ontem, como hoje, os banqueiros, o freeport, o siresp, as armas, as fardas, os aviões, os submarinos, as universidades privadas, os meninos da Casa Pia e a justiça a passo de lesma, (mas só quando interessa). Tudo rasteiro, fundo e imundo. Alguém dizia dias atrás que o momento é semelhante aos dias da 1ª República. Não sei, mas se o meu duro pai fosse vivo, talvez me confirmasse que sim. Dá a ideia de que como nação estamos, hoje, mais uma vez num pico de orfandade. Parece não haver ninguém capaz de nos estender uma almofada, mas é bom que saibamos, que antes de mais, dependemos de nós.
Contudo, ainda desejo partilhar aqui uma ideia, deixada numa crónica, por um historiador, professor, fazedor de opinião e reaccionário, que por uma vez teve alguma lucidez - é bom que os comunistas não se desunam, porque neste momento difícil se deixarem de ter a possibilidade de manter as coisas socialmente controladas, então talvez nos venhamos a arrepender - . Palavras sábias. Parece-me que de facto, mais uma vez, como em tantas outras ao longo da história, que vamos ser nós, Comunistas, a tirar as castanhas do lume, ainda que aqueles a quem mais damos não nos entendam. Não sei se é fado, o que eu sei é que não vale desistir. Por mim, quero todas as noites continuar a falar para a almofada com calma e dormir em paz.
Pelo molhe interior, a chamada meia-laranja corriam e correm, numa espécie de romaria, famílias inteiras na hora da chegada ou da partida dos barcos da frota do bacalhau. Recordo-me de gente estrangeira, franceses e alemães, de gravador na mão, a registar sons de alegria quando da chegada, ou de dor na partida. O som do barco na despedida, parecia um punhal que retalhava e entrava pela carne. Muitos dos meus amigos de escola, tinham pais nesses mares longínquos e partilhavam com eles poucos dias por ano. Ficaram barcos célebres, o Santa Mafalda, o Santa Joana Princesa, o Capitão Ferreira, o Rainha Santa Isabel e outros, alguns utilizando ainda a técnica da pesca à linha.
Há anos atrás, movido pela saudade, comprei uma revista de grande qualidade gráfica e documental, editada por alturas da exposição de 1998, a “oceanos”, que trata exactamente dessa epopeia do bacalhau. Não me foi barata, mas valeu a pena, porque me respondeu às saudades e a muitas inquietações. Dessa revista desejo, nesta hora de novas inquietações, sublinhar aqui justas preocupações.
… Em finais do século XVIII, os colaboradores das memórias Económicas da Academia, lastimavam a decadência das pescarias do reino de Portugal. Apontavam como factores dessa decadência a extrema ignorância e pobreza dos pescadores…as vexações dos oficiais de justiça quando da arrecadação dos tributos...
…mas então como explicar que Viana do Castelo ainda contasse com uma flotilha de 80 embarcações, em 1750? E porque razão em 1816, já não tivesse uma única?... é que tomadas do delírio das grandezas, todas elas (as embarcações) se tinham metido de carreira para o Brasil, que foi sempre terra encantada.
…Alberto Souto, deputado por Aveiro, em 1097, disse… – bom seria que se protegesse essa importantíssima indústria através da aplicação “na protecção aos pescadores, marinheiros e empresas nacionais uma pequena parte desse imposto”, evitando-se, assim, “ a emigração das terras da beira-mar…”
Dá a ideia de que nada nesta pátria muda e duvido que alguma vez este povo tenha sido feliz. Estamos há séculos entregues a elites de fancaria, inapta, de um só sentido, que salivam apesar de pança cheia, mesmo com o povo de rastos. Ontem, como hoje, os banqueiros, o freeport, o siresp, as armas, as fardas, os aviões, os submarinos, as universidades privadas, os meninos da Casa Pia e a justiça a passo de lesma, (mas só quando interessa). Tudo rasteiro, fundo e imundo. Alguém dizia dias atrás que o momento é semelhante aos dias da 1ª República. Não sei, mas se o meu duro pai fosse vivo, talvez me confirmasse que sim. Dá a ideia de que como nação estamos, hoje, mais uma vez num pico de orfandade. Parece não haver ninguém capaz de nos estender uma almofada, mas é bom que saibamos, que antes de mais, dependemos de nós.
Contudo, ainda desejo partilhar aqui uma ideia, deixada numa crónica, por um historiador, professor, fazedor de opinião e reaccionário, que por uma vez teve alguma lucidez - é bom que os comunistas não se desunam, porque neste momento difícil se deixarem de ter a possibilidade de manter as coisas socialmente controladas, então talvez nos venhamos a arrepender - . Palavras sábias. Parece-me que de facto, mais uma vez, como em tantas outras ao longo da história, que vamos ser nós, Comunistas, a tirar as castanhas do lume, ainda que aqueles a quem mais damos não nos entendam. Não sei se é fado, o que eu sei é que não vale desistir. Por mim, quero todas as noites continuar a falar para a almofada com calma e dormir em paz.
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