quarta-feira, 20 de junho de 2012

O futebol como instrumento ressabiado


Augusto Alberto


Um corpo de São Bartolomeu está em Roma e um outro em Beneveto. Em ambos os corpos falta a calote do crânio. Uma está na Catedral de Frankfurt e a outra no mosteiro de Lune. Vinha eu a pensar na “ubiquidade” dos santos quando, em pleno voo, o comandante do avião informa, primeiro em alemão e depois em inglês, já no fim da viagem, entre Munique e Lisboa, que a Alemanha ganhou à Dinamarca por 2-1 e Portugal, fez exactamente o mesmo resultado contra a Holanda, pelo que a Alemanha e Portugal jogarão os quartos de final. Dentro do avião, ressoa o portuguesismo. Eu que ia a meditar na “ubiquidade” dos corpos, vejo-me a concluir que um povo que só consegue alcançar a felicidade à custa unicamente de uma simples vitória num jogo de futebol, não merece a “ubiquidade” da felicidade e do respeito.

Depois, vejo em casa dois importantíssimos jogos e conclui o que o mesmíssimo braço do “ubíquito” Platini, tal como o corpo e o crânio de São Bartolomeu, é estendido em vários estádios. Porque umas selecções são mais do que outras, a “infâmia” passou pelos jogos que celebraram as vitórias da Espanha sobre a Croácia, que determinou a eliminação da Croácia e o apuramento da Espanha e no jogo que opôs a Inglaterra à Ucrânia e que ditou a eliminação da Ucrânia e a passagem à fase seguinte da selecção tricolor, a França.
Em palavra simples, o que quero dizer é que as selecções dos países do Leste são para desancar, porque apesar da democracia, essa coisa que estica como um elástico até onde quem manda quer, não consegue perdoar a países que escolheram num momento da vida, a ideia do socialismo.
Blokin, esse claríssimo jogador da futebol, e actual treinador da Ucrânia, apesar da sua selecção ter sido esbulhada com vista a levar a França à fase imediata, tal como outrora, quando a União Soviética foi duramente roubada, despediu-se do jogo, com lisura e sem ressentimento. Coisa que aprendeu, e ficou, ainda que doa, nos bancos da escola.
Este jogo e este campeonato da Europa são simultaneamente uma trapaça e um embuste. E esta democracia politica e desportiva é uma merda. Porque a “ubiquita” UEFA, que tem longos braços e enormíssimo crânio, consegue essa coisa espantosa: declarar vencedor quem no jogo foi derrotado.
Anos após, continuam por cá ressabiados e revanchistas que aproveitam tudo, para o ajuste de contas com a História. Tal como S. Bartolomeu, há gente que acabará sempre esfolada e segurando na mão a sua própria pele, com o seu instrumento de súplica, esta imunda democracia.

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