Vivo na Figueira da Foz desde 1980. Não terei, certamente, muitas recordações do velho e mítico salão da Associação Naval 1º de Maio, consumido pelas chamas há 12 anos. Ainda assim tenho algumas, e, entre elas, recordo que foi lá que vi, no âmbito do Festival Internacional de Cinema da Figueira da Foz, cujo desaparecimento foi um dos legados de Santana Lopes na sua passagem pela cidade, dois memoráveis filmes: “Roma, cidade aberta”, com argumento de Federico Fellini e direcção de Rosselini e o “Diário de uma criada de quarto”, de Luís Buñuel. Vem até a talhe de foice relembrar que o vice-presidente daquele conhecido político lisboeta era Daniel Santos, agora candidato independente à CMFF.
Foi lá, também, que tive o privilégio, jamais repetido, de ver e ouvir, pela primeira e única vez ao vivo, um génio com uma guitarra portuguesa nas mãos. Era a Festa “Férias”, organizada pelo PCP.
Hoje, 23 de Julho, faz anos que os deuses nos roubaram Carlos Paredes. Mas para falar de um artista, nada melhor que um outro. A palavra, portanto, e o lápis, a Fernando Campos:
“Primeiro, uma declaração de interesses. Nunca gostei de fado. Nem sequer gosto daquilo que chamam guitarra portuguesa, que é uma coisa que os portugueses tocam com dedais na ponta dos dedos, mais ou menos como as portuguesas cosem os botões. Detesto o seu estridente timbre metálico e odeio os lânguidos trinados piegas que em Lisboa, dizem, identificam a alma portuguesa, seja lá isso o que for. Posto isto, Carlos Paredes era um génio. E tinha talento. Apenas um génio com talento seria capaz de tanger a alma com instrumento tão duvidoso. A alma portuguesa que eu pressinto na sua guitarra vem de mais longe e de mais fundo; é mais forte, mais grave e tem uma afinação mais acima (Coimbra). Possui subtilezas e um lirismo viril que não têm nada que ver com a melíflua e dengosa pieguice dos trinados que se ouvem no país, pelas capelinhas, pelas lezírias ou em Lisboa, pelas vielas.
Foi lá, também, que tive o privilégio, jamais repetido, de ver e ouvir, pela primeira e única vez ao vivo, um génio com uma guitarra portuguesa nas mãos. Era a Festa “Férias”, organizada pelo PCP.
Hoje, 23 de Julho, faz anos que os deuses nos roubaram Carlos Paredes. Mas para falar de um artista, nada melhor que um outro. A palavra, portanto, e o lápis, a Fernando Campos:
“Primeiro, uma declaração de interesses. Nunca gostei de fado. Nem sequer gosto daquilo que chamam guitarra portuguesa, que é uma coisa que os portugueses tocam com dedais na ponta dos dedos, mais ou menos como as portuguesas cosem os botões. Detesto o seu estridente timbre metálico e odeio os lânguidos trinados piegas que em Lisboa, dizem, identificam a alma portuguesa, seja lá isso o que for. Posto isto, Carlos Paredes era um génio. E tinha talento. Apenas um génio com talento seria capaz de tanger a alma com instrumento tão duvidoso. A alma portuguesa que eu pressinto na sua guitarra vem de mais longe e de mais fundo; é mais forte, mais grave e tem uma afinação mais acima (Coimbra). Possui subtilezas e um lirismo viril que não têm nada que ver com a melíflua e dengosa pieguice dos trinados que se ouvem no país, pelas capelinhas, pelas lezírias ou em Lisboa, pelas vielas.
Este desenho é uma homenagem a um artista que para além disso é uma espécie de mártir dos artistas. A sua longa e terrível agonia representa o pior pesadelo de todos nós: ele suportou sozinho e impotente, durante 11 longos anos, o espectáculo devastador da própria incapacidade física para concretizar o seu talento. Presumo que deve ser isso o fado; ou a alma portuguesa. Ou a puta que pariu.”
publicado em http://revolucionaria.wordpress.com/
2 comentários:
Excelente homenagem ao Mestre Carlos Paredes.
Um abraço.
Que viva Paredes!
http://movimentodaspalavrasarmadas.blogspot.com/
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