segunda-feira, 29 de outubro de 2012

A ponte


Augusto Alberto


 Luís e Alexandra são um casal real. De tão real, estão desempregados e com viagem da muito celebrada classe média, para viver debaixo da ponte, porque não tem dinheiro para a renda, nem para pagar o aluguer de um quartinho.   
Vidas simples. Visitam a farmácia como qualquer anónimo cidadão. Um xarope para a tosse, uns rebuçadinhos para a garganta. Gostam da senhora doutora. Uma mulher de meia-idade, um pouco abrasiva talvez, que gostava de dizer que este era o país, por poucas razões, das manifestações. Mas agora a senhora doutora colocou uma faixa preta a decretar o luto na sua farmácia e por força esteve na manifestação da sua classe, em Lisboa, porque a farmácia corre o risco de fechar.
   
Luís e Alexandra, com regularidade, ao domingo como o comum dos casais, combinavam um almoço no restaurante do bairro. Conversavam bastante com o dono. Um homem decidido e que também achava, tal como a senhora doutora da farmácia, que este país se perdia em manifestações. Por sorte, numa tarde molhada e desagradável, de regresso à ponte, conseguiram ver na tv a manifestação dos senhores da restauração, e por ironia, o senhor do restaurante estava lá e, pelos vistos, também molhou a sopa no automóvel do deputado da maioria, Duarte Pacheco.
Luís e Alexandra, talvez tenham sido tocados pelas opiniões da senhora doutora da farmácia e do senhor do restaurante e por isso, por ora, para além de dormirem debaixo da ponte, estão muito confusos. De todo o modo, tal como Luís e Alexandra, também a senhora doutora da farmácia e o senhor do restaurante, estão impiedosamente acossados, e por isso sentiram necessidade de pisarem as mesmas ruas que o pessoal do barro, da malha e do ferro. Que ironia!
Podem acreditar que melhores dias virão, evidentemente, porque o capitalismo, malgrado sofrer de doença estrutural e endémica, vai continuar a lançar cânticos de sucesso.
Contudo, saibam que os gadgets de última linha e os carrinhos de gama média, são só para alguns. Não duvidem, este país vai continuar a ser uma colossal misericórdia, instituição, aliás, onde Luís e Alexandra, vão em breve, buscar o prato com batatas e bacalhau mais duas rabanadas, para o aconchego da noite da consoada. Reposição das sopas dos pobres, da filosofia caritativa do tempo fascista, tão ao gosto do ministro Mota Soares, em quem o senhor do restaurante mais a doutora da farmácia, por ventura, votaram.

1 comentário:

Sara disse...

Lugares bonitos que eu gostaria que este ano a ser em torno deles em algum ponto que talvez este ano pode ir para encontrar os melhores Hoteis em foz do Iguaçu cm os melhores preços garantidos!