Augusto Alberto
O largo da Má-Língua em Buarcos, se assim se diz, foi porque foi lugar de aveludadas ou diabólicas conversas. Por sobre a sua calçada passou no início do século o americano. Transporte feito de uma carruagem que se deslocava sobre carris, puxada por uma dupla de cavalos ou mulas, num tempo em que a Figueira, fruto de várias influências, estava na vanguarda. O americano transportava pessoas, bens e carvão, desde a mina do Cabo Mondego, passando a má-língua e o ténis, começava a bordejar a praia do peixe e o Mondego, até à estação do caminho-de-ferro da cidade, fim ou o início da linha da Beira Alta. Em anos mais modernos, foi ainda fim de linha dos transportes públicos urbanos, e por debaixo, no areal, deram-se os primeiros pontapés na bola. Sempre foi um admirável miradouro sobre o areal, as gaivotas em bando, o mar calmo ou revolto, a espuma e a bruma que banha e encobre o molhe que ajuda a uma melhor entrada dos barcos no rio. Continua local de culto, porque apesar de vicissitudes e de uma arquitectura sem grande nota, que a delimita, continua a manter a traça de vila piscatória. Contudo, tem um prédio com duas fachadas, forradas com um belíssimo azulejo azulado, em cuja aresta que as liga, existe um pequeno nicho, tapado com uma pequena cúpula, em forma manuelina, que recebe no seu interior, a virgem com o menino nos braços.
O largo da Má-Língua em Buarcos, se assim se diz, foi porque foi lugar de aveludadas ou diabólicas conversas. Por sobre a sua calçada passou no início do século o americano. Transporte feito de uma carruagem que se deslocava sobre carris, puxada por uma dupla de cavalos ou mulas, num tempo em que a Figueira, fruto de várias influências, estava na vanguarda. O americano transportava pessoas, bens e carvão, desde a mina do Cabo Mondego, passando a má-língua e o ténis, começava a bordejar a praia do peixe e o Mondego, até à estação do caminho-de-ferro da cidade, fim ou o início da linha da Beira Alta. Em anos mais modernos, foi ainda fim de linha dos transportes públicos urbanos, e por debaixo, no areal, deram-se os primeiros pontapés na bola. Sempre foi um admirável miradouro sobre o areal, as gaivotas em bando, o mar calmo ou revolto, a espuma e a bruma que banha e encobre o molhe que ajuda a uma melhor entrada dos barcos no rio. Continua local de culto, porque apesar de vicissitudes e de uma arquitectura sem grande nota, que a delimita, continua a manter a traça de vila piscatória. Contudo, tem um prédio com duas fachadas, forradas com um belíssimo azulejo azulado, em cuja aresta que as liga, existe um pequeno nicho, tapado com uma pequena cúpula, em forma manuelina, que recebe no seu interior, a virgem com o menino nos braços.
Há dias, por lá, seguia uma senhora cerca de dez metros à minha frente, a quem eu chamo a “savonarola” de Buarcos, mulher que diariamente calcorreia a avenida até à Figueira e volta, pregando a fé de Cristo contra a vida pagã. Quase sempre transporta uma pequena moldura que embeleza uma figura do menino e um livro, que bem poderá ser o dos salmos. Em dias de chuva e frio, torna a penitência mais cruel, porque com os chinelos na mão, caminha, com a planta dos pés chapinhando na água. De modo geral reza alto, pede graças para o povo, a reconversão e clemência para os desavindos.
Pois foi esta “savonarola”, que nesse dia de quase encontro, me assustou, quando inopinadamente se voltou para trás e exclamou: “ai meu menino que gosto tanto de ti”. No assombro, estremeci, porque já deixei de ser menino e porque nunca tive qualquer relação com a penitente, mas logo me recompus, porque percebi que o gesto era para o menino que repousa lá no nicho no colo de sua santa mãe.
Não sei se esta “savonarola” assistiu ao límpido e santo debate entre o Padre Carreira e Saramago. Mas presumo que tanto lhe fará, porque nela nada muda. De qualquer modo, se a senhora tiver oportunidade de ler este singelo texto, sempre aproveito para lhe dizer que nos tempos que correm é bem mais importante discutir e alertar sobre coisas mais materiais do que sobre coisas da fé. Aliás, em linha com as preocupações terrenas de Narciso Miranda, que excomungado, diz, ainda não perdeu a fé no “socialismo”, por isso não o discute, mas está materialmente preocupado, com medo das perseguições de que é vítima por parte dos seus, ainda, camaradas.
Dando de barato que Narciso foi um “quadrão” do “socialismo”, caído de repente em desgraça, confesso que exagera um tanto, porque me parece que no renascimento de Matosinhos, ainda não medrou outro papa Alexandre nem um novo Médici e por isso, não há perigo de fogueira em praça pública.
Pois foi esta “savonarola”, que nesse dia de quase encontro, me assustou, quando inopinadamente se voltou para trás e exclamou: “ai meu menino que gosto tanto de ti”. No assombro, estremeci, porque já deixei de ser menino e porque nunca tive qualquer relação com a penitente, mas logo me recompus, porque percebi que o gesto era para o menino que repousa lá no nicho no colo de sua santa mãe.
Não sei se esta “savonarola” assistiu ao límpido e santo debate entre o Padre Carreira e Saramago. Mas presumo que tanto lhe fará, porque nela nada muda. De qualquer modo, se a senhora tiver oportunidade de ler este singelo texto, sempre aproveito para lhe dizer que nos tempos que correm é bem mais importante discutir e alertar sobre coisas mais materiais do que sobre coisas da fé. Aliás, em linha com as preocupações terrenas de Narciso Miranda, que excomungado, diz, ainda não perdeu a fé no “socialismo”, por isso não o discute, mas está materialmente preocupado, com medo das perseguições de que é vítima por parte dos seus, ainda, camaradas.
Dando de barato que Narciso foi um “quadrão” do “socialismo”, caído de repente em desgraça, confesso que exagera um tanto, porque me parece que no renascimento de Matosinhos, ainda não medrou outro papa Alexandre nem um novo Médici e por isso, não há perigo de fogueira em praça pública.
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