sábado, 9 de janeiro de 2010

Os meus penúltimos sapatos adidas, com que corri, foram comprados em Havana

Augusto Alberto
(texto e fotos)

Os textos aqui publicados sobre Cuba provocaram, como seria de esperar, discussão. Alguma sem qualquer nexo, outra, contraditória.
De verdade, tenho que dizer que Cuba não é o paraíso na terra. É só uma pequena ilha que realizou alterações demasiado profundas e inconvenientes, sobretudo, estando situada onde está, por ser exemplo e resistir como resiste. Para que melhor se entenda cito Frank Solar, professor na Faculdade em Santiago de Cuba e membro de base da Juventude Comunista Cubana: “Cuba foi durante meio século a utopia possível. A pequena ilha, embora pobre e subdesenvolvida, mostra, (apesar das suas insuficiências e desacertos), tudo o que é capaz de fazer um Povo quando decide tomar em suas mãos a construção do seu próprio destino. Produziu notáveis avanços em matéria social, educacional, saúde e desportiva… é hoje uma esperança dos povos num mundo melhor”.
Quem assim fala é um intelectual comunista, que não foi castigado por colocar as questões de modo certeiro. Ou como a verdade, afinal, não é delito de opinião.
Cuba não possui em alta escala, recursos e reservas naturais, como é sabido. Nem possui um exército fabuloso treinado na arte da rapina. Não é uma nação colonial. Nem possui um sistema de espionagem electrónica industrial, como o “excelom”.
Certíssimo! É pobre. Alguns lugares, sobretudo Havana, apesar de grandes esforços têm zonas físicas muito deprimidas, como o histórico bairro chinês. Possui um sistema de transportes públicos obsoleto. Perguntaram um dia ao ministro dos transportes, se um sistema de eléctricos rápidos, não seria o ideal para Havana? Com sinceridade, disse: - “essa solução não está esquecida, mas o país não tem por agora os recursos necessários”. Límpido! Mas tem uma cidade velha, recuperada com apoio da Unesco, que é um modelo de recuperação urbana.
Mas se a natureza não dotou a ilha de riquezas e que se saiba não há por lá uma santa Leonor com a faculdade de multiplicar o pão, é inclusive esparso, como se explicam os notáveis avanços sociais? No saneamento público e no acesso a água potável. Uma taxa de mortalidade infantil, só comparada no continente americano, ao Canadá. Na saúde pública, sem o “segurinho”, (está hoje no topo da biotecnologia, por exemplo). No ensino. Nas artes, (uma visita ao museu de arte Nacional em Havana é um fabuloso exercício). No desporto. Na segurança. As três refeições por dia estão absolutamente resolvidas. Nesta matéria, confessou estrondosamente o presidente de um país riquíssimo em petróleo, água e florestas, Lula da Silva. Pequeno-almoço, almoço e jantar, ainda é um luxo para milhões de brasileiros. Mas por contraste, a natureza oferece-lhe de quando em vez, duras tempestades. Mas não consta que dezenas ou centenas morram no olho do furacão. Estas são questões fundamentais da vida, resolvidas, numa pátria pobre, embargada e acossada, enquanto, escandalosamente, os que possuem as notáveis riquezas, fazem questão de não querer passar para lá da fase da Quinta da Marinha ou das paradisíacas ilhas de Angra dos Reis e, mais grave, os milhões que sobram entram em nova fase, a da marcha à ré.
Não sei quanto mais tempo Cuba irá resistir. Mas estou certo, se a deixarem em paz, lá chegará o eléctrico rápido, os micros ondas, os frigoríficos, os televisores, os telemóveis, as roupas e sapatos de marca, em maior abundância.
Antes de me ir e se as coisas têm de ser medidas assim, então sempre vos digo, que os meus penúltimos sapatos adidas, com que corri muitos quilómetros, foram comprados em Havana. Já sei, escusam de me lembrar, que os há em todo o lado, mas em Havana, foram importados para me serem vendidos em exclusividade, porque descobriram que tinha chegado um tipo importante.

1 comentário:

Ana Tapadas disse...

Cuba seduz-me.
bj