quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Tomo sempre partido por aqueles que gostam de lamber a marmelada

Augusto Alberto


Há muitos anos, mais de 40, no período em que vivi em Lisboa, tive por vizinhos, uma família numerosa e pobre.
Um desses meninos, o João, tisnado pela rua, ganhou a rotina de quase todos os dias me bater à porta, na esperança de lhe dar alguma comida para matar a fome. Em regra, dava-lhe pão com marmelada ou manteiga e fruta. Mas o João, esperto e atinado, a partir de dada altura, de volta e meia, lambia a marmelada ou a manteiga e deixava o pão no lancil do passeio. A minha família começou a ficar zangada e quase a desatinar e ameaçou cortar a ração. Mas eu tomei partido, como sempre, pelo João. Argumentei que também tinha o direito ao seu mimo, apesar de ser pobre, como qualquer menino farto. Era um dever dar-lhe para lamber a marmelada e a manteiga, quando de volta e meia não lhe apetecesse o pão. Em boa verdade, o João também era lambareiro, com todo o direito. Acabei por convencer a família e o João continuou a ter direito ao seu pequeno luxo.
A família do João era numerosa e os pais trabalhavam muito, para lá do justo, ainda que o dinheiro fosse sempre pouco. Chegavam tarde e cansados e os mais velhos dos filhos, cedo começaram a ter tarefas da lide e liderança doméstica.
Lembro-me desta pequena história sempre que os teóricos da demografia e da natalidade dão palpites sobre a baixa taxa de nascimentos, que por este andar haverá de por fim à pátria antes que o sol perca força, se ponha e ponha fim à nossa existência.
Ainda outro dia li que em Portugal nascem poucos meninos. Pudera! E porquê? Porque passados tantos anos, as famílias, tal como há 40 anos, continuam a trabalhar muito e o que ganham, é tão curto, que continua a não chegar. Ainda por cima, sem terem a almofada da tropa, que durante cerca de 4 anos, dava botas, roupa, comida e cama lavada. Com este cenário, a taxa de natalidade só pode minguar, evidentemente.
Afinal, o país que tomou o Carmo em 74 para começar a mudar, continua afinal tão igual. E porquê? Porque logo apareceu uma gente, “alegre”, a falar-nos de um mundo moderno e mais perfeitinho, feito do socialismo de rosto humano, ou socialismo em liberdade. E no que é que isto deu? Ora no que é que isto deu? Deu em exploração em liberdade, que aos indígenas do sítio trouxe redobrada pobreza, ainda por cima, consubstanciada em leis, por exemplo, que os podem por a trabalhar até 60 horas por semana. Ou o exemplo mais abstruso da escravatura legalizada e de como a família pode ser mandada às malvas. Mas a questão é que as famílias indígenas, continuam a comer pouco, e mais grave, para além de calar, gostam de repetir, e por isso não admira que os meninos vão sendo coisa rara e essa caca do socialismo de rosto humano, pareça de pedra e cal. Tudo tão legal, é certo, mas quero aqui lembrar aos teóricos destas coisas, que no fascismo se trabalhava legalmente 48 horas.
Pois é!

2 comentários:

João Henrique disse...

Como é que o "saber e o conhecimento" não é para servir as pessoas na sua genaralidade, mas antes para explorá-las...?
Atenção! a escravatura humana existe.Mas desta feita, com uma máscara dita de rosto humano.

Um abraço.

Fernando Samuel disse...

Muito bem lembrado...

Um abraço.