sábado, 13 de março de 2010

Que sorte!

Augusto Alberto

O Mar Egeu banha a Turquia, Creta e a Grécia, e está carregado de pequenas ilhas, muitas, inabitadas. Pelas suas águas passam barcos com gente em relaxe. É sabido que muitos homens descartam a hipótese de ter um iate, em favor de semanas de aluguer, passadas nos recônditos das Ilhas gregas, sulcando as calmas água do Egeu. São homens recatados, que desse modo fogem das vistas e dos incómodos das fotos e do povo, que é ignaro, olhudo e invejoso e que já quase não tem para a galheta do azeite.

Famílias inteiras estendem-se na coberta do iate, lendo a paisagem ou dando o corpo ao sol. Lânguidos à chegada do lusco-fusco do fim do dia, regressam à cabine e em paz saboreiam os acepipes que o cozinheiro qualificado, recomendou e cozinhou. Uma vida santa, feita de modorra e pachorra. Nesse mar azul-turquesa, Maria Callas aproveitava para recuperar e aveludar a voz e Jacqueline, sentada em sítio próprio, mandou dar uma volta o luto por Keneddy. Onassis, nada tolo, comeu e saboreou das duas e do Egeu.

Lembro-me agora destas histórias, que não acabam aqui, porque chegou o PEC (programa de estabilidade e crescimento) e porque a Grécia, apesar do seu admirável Egeu e das suas belíssimas ilhas, está em bancarrota.

E porque a história não está completa, como disse, e tem sujeitos, lembro-me que há uns anitos a abertura de um dos telejornais deu nota de um acidente com um desses iates de luxo, em cruzeiro pelo belíssimo Egeu, que transportava uma discreta família portuguesa. Por ventura, uma daquelas que não está para ser olhada e por isso, não tem iate próprio por cá, mas pode tê-lo por lá, ou simplesmente o aluga.

Recordo-me que a família deu ar de poucas falas, porque deu conta da captura do seu segredo e o capitão, debruçado sobre a amurada, apresentou ao repórter um ar façanhudo, porque a descrição nestas coisas é a alma do próprio negócio e da viagem.

Perguntarão os caros leitores deste simples blog, ao que venho, se a vida é de cada um e é assunto reservado? Bem sei, mas as questões para mim não são tão simples.

Porque gente como Sócrates e Platão, discípulo do primeiro, que privilegiou a rectidão e a humildade, se tivessem adivinhado que gente ai vinha, teriam tomado as devidas cautelas, impedindo a pátria grega, de parir gente assim, completamente inapta, vassala e de um lado só. E por fim, está-me a parecer que a tal família que quase naufragou ao embater nos costados de um rochedo, deve estar a pensar que o tal PEC, lhe está a fazer, só, uma breve e ligeira comichão. Por absurdo e ao arrepio do que disse o grego Sócrates, “conhece-te a ti mesmo”, o Sócrates de cá, nome próprio, só consegue conhecer e conceber como malhar nos fracos, porque o PEC, sobretudo, é grande para os ricos.

Neste momento em que escrevo, fui ver a meteorologia para o Egeu e ela disse-me que o tempo está e vai estar lindo e de temperatura de amêndoa e por isso, estou em crer que não há PEC que lhes afunde o iate. Que sorte que nós não temos.

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