quarta-feira, 8 de junho de 2011

“Um ovinho pela manhã, boa ideia da mamã”

Augusto Alberto

Após muito povo ter dado carta branca para levar adiante o roubo, pelo sim, (quem sabe, alguns irão hoje ao centro de emprego e dir-lhe-ão:- tenho muita pena, acabou-se-lhe o subsidio) e ainda outros, pela omissão, (dos que foram à praia e no regresso, ficarão a saber que o posto de trabalho foi extinto), vem-me o desejo de reflectir um pouco sobre as idiossincrasias do português.
E nesse sentido, recordo um dos mais notáveis momentos publicitários que passaram pela TV. O homem preto, com uma cadeira ferrada pelos dentes e que fazia círculos em redor do seu centro de gravidade, que acabava com uma voz que confirmava a vantagem da marca: - é um artista português. Usa pasta medicinal Couto. Também eu fui sugestionado. Hoje passou a produto gourmet, e por isso, só ao alcance de finíssimos dentes.
Mas lembro ainda um outro raro momento, que apelava ao consumo de produtos nacionais, e que nos trazia uma menina com os cabelos em caracol e em idade da primária, que logo pela manhã, antes de ir para a escola, comia um ovo e depois dizia: - um ovinho pela manhã, boa ideia da mamã. Apesar de bem avisados, lá em casa, contudo, ficávamos pela metade. Na altura éramos alguns e tal como a menina, eu era um menino da primária, e por isso de volta e meia diziam-me, vai a pastelaria com a picheira e que te dêem 15 tostões de claras. Lá ia. Voltava com as claras e o almoço era uma festa, porque se faziam enormes e excelentes omeletas. Aproveitadas as gemas para as especialidades pasteleiras, ficava a arte de fazer omeletas com meio ovo.
Ora cá está como o modo como sobrevivemos revela as nossas idiossincrasias. Não será pela meia fome que deixaremos de correr à fábrica, dar no batente, comer as sopas, beber o copo, dar no batente, e por fim, cansado, beber o último copo e correr a casa. Aliás, nesta matéria já me esquecia da mais célebre arte de falar com o estômago em tempo de fome. A arte de dividir a sardinha por dois. A cabeça para a mãe, e o lombo e o rabo para a filha. E às vezes, até por três. Por isso, um fabiano que recorda como há muitos anos chupava as claras ou simplesmente tomava o gosto da sardinha pelo rabo, já não se admira das idiossincrasias da pátria, nossa mãe e ladra, quando percebe que numa lista para deputados, um qualquer “joãozinho”, possa ser eleito deputado de Portugal e a gente tenha logo a tentação de concluir, que afinal a pátria, continua uma penúria.

1 comentário:

Anónimo disse...

Metade de um ovo ainda era qualquer coisa...mas parece que nem as cascas ficam.Se o povo votou assim é sobretudo pela falta de mensagem da esquerda.Não bastava apelar ao voto, era preciso dramatizar a situação que como se sabe é dramática. O povo deveria ser confrontado todos os dias da campanha com a realidade. Ou votava á direita com as consequências que se vão ver ou votava á esquerda, sabendo que há mais esquerda para além do PS.Por mais que custe ao pcp a linguagem é demasiado rigida e hermética para um povo carregado de medos e inundado em iliteracia e a necessitar de palavras de esperança, sobretudo de ver uma luz ao fundo do tunel.