sábado, 24 de setembro de 2011

O país que cabe numa lata

Augusto Alberto

O que têm de comum Vaggelis Petrakis, o comerciante arruinado originário da ilha de Creta, que se suicidou debaixo de uma oliveira, com um tiro de caçadeira, ou o outro pequeno comerciante grego, que, sem meios para saldar dívidas e viver com decência, deslumbrou na imolação o fim para as suas angústias, e aqueles dois irmãos portugueses, que despejados e a viverem na rua há um ano, decidiram também acabar com a vida na frente de um comboio rápido, que passava pela estação de Paços d’Arcos?
O que tem de comum, então, gente assim tão triste? Serem cidadãos de países que para qualificar as suas elites não chegam todos os adjectivos do mundo. Pela Lusitânia, sabemos que foi montado um complexo mecanismo, económico, social, psicológico, político, jurídico e cultural, que permite às elites saírem sempre a sorrir, mesmo dos feitos mais macabros.
Elites que desde há muito treinaram o seu povo para o uso de um conjunto de habilidades que permitem que se vegete em vez de se celebrar a vida.
Desde logo, o duplo e o triplo emprego, porque o rendimento do principal trabalho não chega. A fuga aos impostos, como regra. O artifício de receber uma ajuda social e ao mesmo tempo fazer uma caroca, para compensar o fraco rendimento. O uso da velha fórmula de partir uma sardinha em dois, ou agora, a habilidade, muito em moda, de dar passos até uma instituição de caridade, onde se arranja o pobre cabaz que há-de dar para a semana. Ou a inveja, que celebra o egoísmo e o paroxismo de haver sempre muita gente à espera que alguém se mexa para resolver problemas que são de todos. Povo, de tão treinado, está como peixe na água no uso da manha. Que prefere viver de expedientes, a mobilizar-se para mudar para um país em que a riqueza seja mais bem distribuída e os bens sociais sejam um bem de todos.
Sugiro a leitura do romance histórico O império dos pardais, para percebermos como o país de quinhentos, não difere muito do Portugal de 2011. Já vão quinhentos anos! O medo da mudança é canalha, e de tão canalha, vai permitindo que a elite passe como raposa por vinha vindimada, como se não houvesse limites ao desbragamento, enquanto o povo, que vive de truques, não percebe que não passa de capacho, onde pisa a elite, que rebola e se sente muito confortável num mundo cinzelado à sua medida.
Elites de merda. Puxa sacos! Fancaria! Para o país que cabe numa lata.

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